No seu famoso «O nome da Rosa», Umberto Eco abordava a questão da comédia enquanto género mais do que maldito, amaldiçoado. A parte da «Poética» de Aristóteles que versava o género perdeu-se e com ela o lugar da comédia entre as artes literárias.

Ainda hoje a comédia figura entre os géneros menores, do cinema ao teatro. Também o humor na literatura tem dificuldade em arrumar-se entre as estantes da literatura sobretudo no que toca à literatura portuguesa de onde, na realidade, desapareceu no começo do século XX com o desaparecimento de escritores como Eduardo Brun, Gervásio Lobato, António Ferreira, Albino Forjaz de Sampaio, Eduardo Schwalbach, algumas coisas de Augusto Costa e alguns outros. Eça talvez tenha sido o último «grande» e Camilo tinha um humor demasiado subtil e que era perceptível para os muito poucos capazes de perceber como ele brincava (e como brincava!) com os géneros e estereótipos literários da sua época.

Ainda assim, quase todos esses autores eram escritores "sérios" que, por vezes, tocavam o humor. A comédia na literatura é coisa menor e - espante-se - fácil. Pelo menos para a crítica e a academia. Isso compreende-se, é claro, desdenha quem não consegue comprar. E ninguém espera um crítico ou um académico de bom humor. Seria algo tão baixo e fácil como um comediante.

Os grandes grupos livreiros pedem-nos para categorizarmos Vilhena para que saibam em que estante o arrumar. Como é possível fazê-lo? Humor? Vilhena está para lá do humor. Ficção? (mas é tão real...) Banda desenhada/cartoon? (a FNAC arrumou-o na Banda desenhada) Crítica social? (ora aí está uma categoria em falta.) Livro ilustrado? (certamente mas fica um livrinho de bolso esmagado entre álbuns de grande mérito artístico e, sobriamente "sérios".)

Vilhena foi tudo isto e muito mais. A categoria menos «limitativa» seria "Literatura Portuguesa" mas é difícil que o aceitem lá. Afinal aquilo é humor e desenhos de mulheres voluptuosas...

Se Gil Vicente vivesse hoje seria arrumadinho na pequena estante do Teatro e de lá não sairia. Esta é a maldição da comédia: arrancada, na noite dos tempos, da segunda parte da «Poética» de Aristóteles e, como tal, do cânone da literatura ocidental.